do lugar dos outros

do lugar dos outros

quarta-feira, 23 de julho de 2008



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Paris nunca se acaba é uma revisão irónica dos tempos de aprendizagem literária do narrador na Paris dos anos setenta. Fundindo magistralmente autobiografia, ficção e ensaio, vai-nos contando a aventura em que se envolveu quando, numas águas furtadas de Paris, redigiu o seu primeiro livro. E revela-nos, por exemplo, como em parte escreveu esse livro graças aos conselhos para escrever um romance que lhe deu, resumidos numa folha simples, Marguerite Duras, a sua invulgar senhoria.
Paris nunca se acaba é também a história de como, na sua juventude, o narrador se radicou nessa cidade para imitar literalmente a vida boémia de escritor principiante de Hemingway, que ali foi “muito pobre e muito feliz”, e como, pelo contrário, o narrador foi muito pobre e muito infeliz.
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Paris Nunca se Acaba – Enrique Vila-Matas

quarta-feira, 16 de julho de 2008

Observas o rosto hirto na vidraça
e respirando fundo sabes: a luz
alonga os traços como um remorso –
porque tudo é nosso e doutrem.
Roubas e roubam-te, do mais
à margem te mantêm, ou a vau.
Desmunido. Que cem anos
não confortam a cova de um dente,
nem refreiam o susto de quando
o silêncio bate portas – é coisa
pública. Veja-se o caso das mãos:
cinco dedos são poucos. Uma
redige o elo de solidão e já outra
congela o sangue nas torneiras.

António Cabrita – Carta de Ventos e Naufrágios