do lugar dos outros

do lugar dos outros

domingo, 20 de abril de 2008






















MULHERES AMALDIÇOADAS

Como gado pensativo sobre a areia deitadas
Dirigem o olhar para o horizonte dos mares
Seus pés se procuram, suas mãos se aproximam
Doces langores as percorrem e calafrios amargos

Umas amam as longas confidências do coração
No fundo dos bosques onde marulham os rios
Vão desfolhando o amor das infâncias receosas
Entalham a carnação verde dos arbustos jovens

Outras, como irmãs, caminham lentas e graves
Entre rochedos repletos de aparições
Onde Santo Antão viu surgir como lavas
Os seios nus e purpúreos das suas tentações

Outras há que no côncavo mundo dos velhos antros
Pagãos iluminados por resinas que se liquificam
Te chamam para que acalmes suas febres uivantes,
Ó Baco, mestre bálsamo dos remorsos primitivos.

Outras unem a espuma dos prazeres à dor das lágrimas,
Nos bosques sombrios e nas noites solstícias,
Trazem vergastas escondidas sob as longas vestes
Ostentam no peito as insígnias dos seus suplícios

Virgens, demónios, monstros e mártires – dizem.
Sois, de facto, o desprezo forte da realidade visível,
Procurais o infinito, devotas e sátiros,
ora no meio do choro, ora no meio dos gritos

Vós que no vosso inferno minh´alma seguiu,
Pobres irmãs, amo-vos tanto como vos lamento,
Tendes dores sem excesso, uma sede insaciável
E corações repletos de um amor intenso

As Flores do Mal – Charles Baudelaire

1 comentário:

José Leite disse...

Baudelaire, o Príncipe da Poesia, o inspirador de alguns talentos portugueses...

Comme il faut!